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SELVAGEM HIPNAGOGIA (2016)

Entre o sono e a vigília, entre o estar dormindo e o estar acordado, quando se come demais, por exemplo, dá aquele cansaço – e aí então, fica-se naquele vai ou não vai. Mas no fundo ainda se está acordado. Ali, entre a vigília e o sono, que não é sonho, se passa uma linha, uma linha que é uma cadeia de imagens inteiramente autônomas onde não se tem controle algum sobre elas. Seria como se estivéssemos olhando um filme: aquelas imagens passam por você, você observa aquela cadeia de imagens passar. Isso é HIPNAGOGIA. As vezes forma uma história as vezes não. São encadeamentos de atitudes, as quais passarão. Essas imagens ou aquelas, não são originárias no “meu eu”, elas independem dele, elas não possuem esse solo como causa. Um dia disseram a um tal que disse a outro e a mais outro que momentos onde esse chão do eu não está presente, os afetos aparecem, e aparecem de verdade não sendo qualquer coisinha bobinha, mas uma coisa que aparece mesmo – e que daí então o eu some (você some). Nesse instante deixamos de ser humanos podendo virar bichos, bichas, papagaios, cobras ou lagartos. Me lembro daquele menino. Qual? O Robinson, aquele que capturou um papagaio para “ensiná-lo” a conversar com ele. Muitos, muitos mesmo, foram os anos de adestramento para que o papagaio chamasse Robinson pelo nome. Suscitar um Tu? Suscitar alguém que nos diga Tu! A desumanização é a busca infinita do pensamento. Toda a questão do pensamento é procurar os afetos, encontrar a desumanização - para não ser preso pelos sentimentos e pelas emoções ou pelo comportamento – que é manifestação da história pessoal de cada um. Ou seja, toda a questão do pensamento é se libertar exatamente da história pessoal. Desde o álbum de família até as imagens soltas na internet: essa "minha" história pessoal é um conjunto de fantasmas, tristezas, pequenas alegrias, grandes sofrimentos, enormes emoções de novela; será a minha ou a nossa? Acho que a nossa. Posso aqui chamar esse feito de efetuação da arte pela perda do eu, como já tanto cacarejaram tantas, mas tantas bocas por aí, mas não posso visto que o HERÓI ou a HEROÍNA e seu canibalismo impregna as mentes para que se tornem best sellers. O best seller nesse caso, é sempre a personal history de alguém que se diz maravilhoso, porque qualquer narrativa de sua vida tem que ser elogiosa para ele. Gosto de paisagem justamente para me sentar de costas para ela. Ontem alcançamos as paixões através de suas forças gritando em voz alta, em vez de considerá-las como puras abstrações, conferindo ao meu povo um domínio que nos iguala a uma verdadeira curandeira.

Ali do Espirito Santo

Porto Alegre, Março de 2016

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